A arte de interpretar a vida
Pe. Jorge
Ribeiro
A
vida é um fluxo contínuo, um movimento que não se sabe onde e quando se
deságua. A vida é também uma arte, quem sabe lidar com seus meandros pode se
beneficiar mais de suas dádivas. A outros a vida aparece como um peso a se
arrastar ou ainda como um enigma a se decifrar. Que a vida seja descontínua e
ambivalente, quem busca levar a sério a própria
existência e refletir sobre sua estadia no mundo logo toma consciência. Mas
a vida também reflete toda fluidez, transitoriedade e incertezas de tudo que
aparece no mundo e assim, muitas vezes, a vida encarna o desespero e o medo de
quem quer garantias e estabilidade. A vida é o que existe, mas o que nunca faz
falta se não mais existe. Como interpretar a vida? Basta usar de instrumentos
hermenêuticos e de sentenças de sabedoria para poder se apropriar de suas
dimensões? A vida escapa a todo esquema, ela não se deixa aprisionar ou
monopolizar pelas estruturas que porventura se pode construir. Ela escorre
perante todos os aprisionamentos que se possa engendrar. A vida é exuberância e
reticência. Qual a melhor maneira de se apropriar ou de se aproximar da vida
sem ser domado ou aplastado pelas circunstâncias? Não basta fazer uma
dissecação dos seus traços e estruturas, a exegese da vida não abarca tudo o
que ela pode ou não oferecer. Muitos querem transformar a vida num simples
objeto de estudo ou de transformação, mas ela continua aflorando onde menos se
imagina e continua surpreendendo onde nem sequer cogitava possibilidades. E por
que isso? Apenas insubordinação da natureza? Inflexibilidade do espírito? Ou
capricho dos deuses? Quaisquer que sejam as alternativas a vida continua sendo
esse mistério a ser desvendado. Então a pergunta muda de rota: como viver a
vida? Tem uma hermenêutica da vida? A vida é um dom e como tal deve ser
apreciada. Não é um direito, nem um carma e nem um castigo, é um presente. E a
arte de interpreta-la precisa se acostumar com essa vertente. Talvez a melhor
arte seja deixar a vida ser, que ela aconteça e que possamos mergulhar no seu
mais profundo abismo. Qualquer interpretação vem já de outras interpretações e
a vida é mais gostosa de se viver se nos deixamos maravilhar por tudo que ela
apresenta
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