Esquizofrenia desnecessaria

Esquizofrenia desnecessária



Pra que todo esse frenesi e essa correria toda? 
Parece até que o mundo vai se acabar!
Gente perambulando pelas ruas e avenidas…
Filas quilométricas em todas as casas comerciais.

Gente que não tem soldo para pagar as contas
Mas se aventura num réveillon na praia
Multiplicam-se as mensagens e os desejos
O que é isso? Um surto de incertezas?

Músicas altas, sacolas de compras, tráfego intenso
Será o apocalipse? Nada, apenas mais um ano novo
Gente o calendário é convencionalismo
Amanhã tudo vai continuar independente de tudo isso.

Roupas brancas ou coloridas, tenha champanhe ou simples café
Viagem pra praia (preferência das oferendas) ou em casa
Façamos o que quisermos, quem viver vai ter outro dia comum
Aumenta apenas as expectativas e as dívidas!

Todo o resto continua tal e qual, e vai comemorar o que? 
Ah sim a nossa superação e persistência, o fato de se ter sobrevivido.
Fazer o que né, aproveito e bebo um gostoso champanhe

Querendo ou não também estou nessa esquizofrenia desnecessária!

Razoes para crer?

Razão para crer?




Por que creio? Preciso crer para continuar vivendo. Pois quando o escândalo não é mais possível é porque não sobrou mais nada. Optar pela angústia? Deixar-se levar pelo desespero? Enveredar pelas trilas da tristeza? O que me resta? Acreditar e esperar. É verdade que o importante é o hoje, devo dar sentido e plenitude à vida presente, o amanhã e o futuro são tão incertos, por isso concordo em parte com Russell que “quando morrerei, serei nada de nada e nenhuma coisa sobreviverá de mim. Eu me esquivo viver tremendo de terror ao pensamento do nada. A felicidade não é menos verdadeira porque deve terminar, nem o pensamento ou o amor perdem o seu valor porque não são imortais”[1]. Temos uma crença e um desejo para o além, mas o que de fato experimentamos é o aquém. E depois? Não tenho a menor ideia. Isso é fatalismo? Não penso que seja, mas não posso negar ou aviltar o meu presente em função de um futuro. Então é ateísmo? Quero que Deus me salve hoje, para não ter de perder tempo consertando o já passado. Crer em Deus para mim é algo necessário para que eu possa persistir, continuar e perseverar no bem. Se eu não acreditasse em Deus, qual o motivo de fazer o bem ou de me preocupar com o depois? Aqui não falo das manifestações religiosas ou das mitologias religiosas, mas da fé purificada, que oferece um significado profundo à existência independentemente de qualquer explicitação sociocultural. Acordar cedo, trabalhar, pagar as contas, projetar o futuro, ajudar o próximo, qual o sentido de tudo isso se não acredito em Deus? Seria suficiente a emoção, o temor ou a comoção para evitar o mal e se esforçar em viver os valores? Qual o limite da caridade[2]? O que impele alguém a ajudar o outro? Sem a crença o acaso tomaria corpo e as coisas mudariam sem logicidade e ficaríamos mais perdidos que tudo. Razão suficiente para crer?  Para mim a inteligibilidade da realidade é um fator primordial para uma vivência responsável e para não desistir quando a lei da vantagem impera até nas esferas religiosas (onde deveria reinar a gratuidade e o serviço); se eu não acreditasse num Deus providente que caminha com a humanidade seria mais viável viver como Diógenes[3], pois não teria vantagem nenhuma se consumir por qualquer outra coisa. Por que cuidar das pessoas, por que os sentimentos de compaixão, por que somos bons? Ou simplesmente por esporte ou por tradição cultural? Ou tem uma razão maior e mais consistente? A vida é absurda? Os limites são absurdos? É desgraça o que é próprio da nossa espécie? Se não tem razão para crer, para que o esforço de provar essa possibilidade[4]? Entre objetivo e subjetivo, a razão maior está na própria experiência, ainda que ela seja negativa. Tudo o que construímos é para melhor corroborar essa chama que orienta a caminhada, do contrário, tudo se transforma em flatus vocis, ou seja, puro ritualismo vazio e que apenas alimenta as superstições. A razão de crer é algo que sustenta e impele a ter certeza que vale a pena viver apesar de toda essa des–razão que o mundo oferece. Crer além e apesar de tudo, é o motivo pelo qual encontro força para continuar vivendo e buscando ser feliz a cada dia.



[1] RUSSELL, B., Why I Am not a Christian.
[2] VATTIMO, G., Credere di credere.
[3] Diógenes: viver como um cão, sem esforço e do que se encontrava.
[4] NAGEL, T., Mortal Questions.

Pra se pensar ....

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