O HOMEM PARASITA
O ponta-a-pé dessa reflexão foi o livro maravilhoso e provocatório
de Patrick Savidan, intitulado Repenser
l’égalité des chances, que além do aprofundamento sobre a coesão social e
sobre a doutrina da igualdade de oportunidades, em um dos apartados que estuda
o valor da justiça na era do indivíduo, o autor fala do “Homem Parasita”, como
intitulamos nosso tema. Ele é muito pertinente ao dizer que paridade de
oportunidades nem sempre é positiva, pois tantas vezes é um fator de injustiça
e de fragmentação social, pois existem os parasitam que somente absorvem e
usufruem de tudo que lhes possibilitam e não colaboram ou nem sequer se
responsabilizam pela própria condição de dependentes.
Falando nessa mesma direção, a música protesto também
retrata essa dimensão parasitária da pessoa e argui a respeito do homem
parasita que “procurando abrigo ele rouba tua casa, em nenhum
momento ele pensa em você” (Over Shad). O homem parasita é toda e qualquer
pessoa que busca se beneficiar dos recursos do estado e instituições ou da
bondade e generosidade das pessoas e considera essa “assistência” como um
direito e se acomodam na situação de agraciado ou indigente.
Assim, quando o
autor do livro fala das múltiplas memórias do pauperismo ele distingue entre os
“bons pobres e maus pobres”, quer dizer, existem os pobres frutos de uma
fatalidade, de situações se injustiça ou por sofrerem de um handicap, mas
existem também os pobres desonestos, negligentes e que se recusam prover as
próprias necessidades, a esses, diz o texto, devem ser punidos. Na verdade ele
divide os necessitados entre os que se esforçam e os que sofrem desvantagens,
que devem ter direitos assegurados e os que não querem trabalhar, os quais são culpados
da própria ociosidade, onde a desocupação é o pai de todos os vícios, a esses
se chama de parasitas.
O texto faz um apelo a se evitar a simpatia mórbida à
aqueles que consomem como se produzissem e nada de favorecer leis que criam os
pobres que elas assistem, pois a caridade legal além de empobrecer as pessoas,
pois as faz dependentes, ela também os deprava, o que significa que o direito
ao benefício muitas vezes legaliza a inferioridade reconhecida da mesma pessoa.
E isso não é somente do ponto de vista econômico não, também intelectual,
psicológico e moral. O aluno que não estuda e não se esforça, porque esse deve
ser aprovado? E aquele que não quer nada, apenas de corpo presente por outras
razões que não a do estudo, por que deve ser tratado com igualdade de
oportunidades como aqueles que vivenciam o próprio processo de aprendizado?
Cada um deve arcar com as próprias responsabilidades,
não existem escolhas neutras e muito menos se deveria pretender querer direitos
sem arcar com os deveres. Por isso se
clama por uma “Justiça social capacitária”, ou seja, por uma política inclusiva
e não somente de assistência, pois não basta a igualdade de oportunidades,
faz-se mister trabalhar pela equidade em confronto a certo tipo de
igualitarismo que permeia a nossa mentalidade de adeptos da democracia e da
democratização dos recursos e das chances.
Certamente devemos todos trabalhar para eliminar os
efeitos perversos da estratificação social, assim evitando o máximo possível a
costumeira metodologia da arbitrariedade e favorecer aquela da meritocracia, mas
levando em conta que sem erradicar a discriminação até os méritos sub-entram no
rol das desigualdades, pois muitos não desenvolvem os talentos por causa de exclusões
ou chances não favoráveis. O que se almeja e se luta é por uma igualdade de
oportunidades sustentável, dado que uma
pessoa prejudica a outra não somente pela ação, mas também pela inação, onde a
mesma igualdade deve ser pensada em uma concepção justa da igualdade de
oportunidades, isto é, não é pelo fato de alguém pertencer a uma minoria ou a uma
classe desfavorecida ou historicamente dominada que tem por isso,
automaticamente, o direito e a paridade sobre outros indivíduos em pé de igualdade,
o que seria uma ditadura do proletariado ou dos excluídos.
Não se pode esquecer que a liberdade é, para nós, uma
pretensão, assim, a responsabilidade não é apenas uma questão de escolha e deve
se referir a um sujeito concreto, porque cada pessoa é chamada a ser responsável
por suas ações, no sentido de que é autor de uma ação que lhe é imputável, para
isso é preciso repensar igualmente a Educação e Inserção: a requalificação de
cada indivíduo, com oportunidades iguais e atmosfera favorável ao bom uso da
sua liberdade, para que que ninguém venha posar de vitimismo, de coitadinho e
exija de tudo e de todos um tratamento facilitador e diferenciado. Somente reeducando
o povo de maneira integral e democrática e inserindo em uma participação ativa
nos rumos da sociedade e da própria vida é que se pode superar a lei carnífice de
querer levar vantagem sobre tudo e até se vangloriar da própria inferioridade
de pessoa parasita.