O medo do outro

O MEDO DO OUTRO
BY Pe. Jorge Ribeiro

O outro, quando situado em relação a si mesmo, é aquele que não sou eu, o diferente de mim. Todas as alteridades (que supõem a identidade) é frequentemente colocada à distȃncia: o outro é associado a outro lugar: que seja um lugar que não seja aqui. Era o outro mundo como dizia os gregos ou os romanos; um oriente fascinante e terrificante como se apresentava a Idade Média; o novo mundo para o Renascimento (América e Índia); a utopia lunar no século XVII, e nos dias atuais o nosso medo....
Hoje em dia não se mede tanto o medo do «outro» por uma distȃncia geográfica, mas se ajunta uma outra razão, a do desconhecido, ou seja, no nosso século se acrescenta o medo ao próprio medo. Será por isso tanto especulação em relação aos extra-terrestres? Temos medo que esse outro seja relamente «totalmente outro»?
Diante do outro, eu não me compreendo mais, eu não me reconheço mais, eu me pergunto se «este também é igual a mim». Este é, como eu mesmo, membro da humanidade, mesma metamorfosis, ou ele está fora dessa humanidade? Muitos pensadores enfrentaram e refletiram sobre essa questão. Não é uma questão superficial e muito menos descontada. Basta perceber as reações que se capitam ao «diferente», ao «estrangeiro», ao «diverso».
A questão do «outro» e o medo que esse provoca invade as nossas casas, familias, comunidades e nações. Por que tanta rejeição aos imigrantes? Por que determinados indivíduos afastamos de nossa convivência? Seria somente porque pode nos causar «mal» ou por que temos medo de perder a nossa identidade e ao nosso «status»?
Analisamos rapidamente alguns pensadores com seus textos, somente para se perceber que é uma questão que sempre encontrou interesse e significado e por fim buscaremos iluminar situações novas que denotam o quanto esse «medo do outro» ainda é tão presente em nosso meio.
Leiamos Aristóteles (384-322 a.C), em Política I,2 e aí vejamos que o filósofo chama de «bárbaro» todos aqueles que não fazem parte da civilização grega e, portanto, são diferentes, inferiores. Com um salto no tempo vejamos Marco Polo (1254-1324), em A diversidade do mundo (1298), LXII, CXCII, escreve e descreve um novo mundo, uma nova realidade paradisíaca, mas tanto quanto a ser controlada e colocado dentro dos padrões europeus. Andamos a Michel de Montaigne (1533-1592), quando no capítulo Dos Coches (Ensaios III,6), ele fala do «novo mundo», América, Brasil, onde relata esse outro como «bom selvagem», gente sábia, civilizada, feliz, mas diferente, por isso causa medo e desconforto ao povo do velho mundo. Citemos um clássico, Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), que no seu Discurso sobre a origem da desigualdade entre os homens (1755), narra que a vida do «selvagem» é mais coerente que aquela do povo «civilizado». E por fim nos aproximemos de um outro pensador: Henri Michaux (1899-1984), o qual no capítulo «O imaginário», n°164, do livro entitulado Un bárbaro na Ásia (1933), coloca o discurso na boca do bárbaro, onde ele denota ao mesmo tempo homour e ironia.
Em todos esses pensadores citados e em tantos outros que se expressaram, o «outro» sempre causa um desconforto, seja como o que há de desprezível que se deva eliminar, seja como um ideal a ser seguido, mas sempre causa um «mal-estar» nos que se percebem estabelecidos, o que a sua vez se traduz em medo. Um medo que causa perseguição, supressão, indiferentismo e «inquisição». Esse outro que a partir dos textos citados é colocado como um «povo», ou um «mundo», é traduzido na dimensão pessoal e particular, como um relacionamento de alteridade, isto é, o rosto do outro me causa uma impressão, que tantas vezes me faz pensar e perceber que existe um «outro», individuo ou mundo, fora de mim, do que é meu. Isso causa choc, maledicências, calúnias, diminuição da figura do «outro» para que eu possa afirmar a minha identidade.
Esse medo do diferente e do outro que foi causa de grandes escravaturas, guerras, genocídios e indiferentismos hoje pode ser visto nas grandes e pequenas «fobias» que transmitimos com as nossas exclusões, com nosso desejo incomensurável de aprovação e de uniformidade, assim como no comportamento atroz do relativismo relacional, moral e social. Apegamo-nos a «pseudas – verdades» e marginalizamos ou esmagamos tudo que não seja nosso «espelho». Somente quando aprendermos e apreendermos o que seja a «tolerȃncia» esse «medo do outro» poderá ser transformado e transfigurado em princípio positivo, ou seja, em fraternidade e convivência. Talvez esteja cometendo uma infração utópica, mas a paz somente é possível se acolhermos o diverso, o «outro», assim como é. Não deixemos que esse «medo do outro» obscureça o colorido que a própria vida nos ofertou.

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