Auto-boicote
Pe. Jorge Ribeiro
Sabe-se do déficit
histórico, das mutilações e negações, o sofrimento da ausência ou da inibição,
mas transformar essas desarticulações do processo de desenvolvimento em estado
permanente de arefação, vitimismo e automutilação, é já uma resposta
desproporcional. Talvez seja melhor atribuir a outrem o que se deve conquistar
e mais fácil culpar os outros que encarar os próprios limites. Não se pode atribuir
todas as fraquezas e defeitos ao ambiente ou às pessoas com as quais se
conviveu ou convive. Tudo tem sua parcela de culpa, mas não determina e nem
muito menos força ninguém a fugir de si e mascarar-se com uma imagem que julga
ideal e oportuna. Por isso, faz-se necessário um autoconhecimento sincero, que
se proponha muito mais que autoajuda ou extração das possibilidades latentes
como num coaching. O conhecimento de si, que é autoconsciência, deve levar a
pessoa a se assumir assim como é, sem essa onda de empoderamento ou revolução,
mas como realidade situacional, onde a pessoa se encara sem medos de seus
monstros e possibilidades.
A jornada do
autoconhecimento tem início, mas jamais terá fim. É como se estivesse subindo
uma montanha sem fim. A cada parte mais alta que você chega, passa a enxergar melhor
as coisas que viu na fase anterior. Assim, a cada avanço que faz no sentido do autoconhecimento,
estará ampliando a visão das conquistas. O
processo do autoconhecimento ocorre quando nos damos à oportunidade de abrir
nossas mentes para o conhecimento, de quebrar os paradigmas estabelecidos no
decorrer da vida e que ficam armazenados na nossa mente. Vale dizer aqui que
paradigmas são modelos mentais nos quais baseamos nossas percepções, ou seja, é
o padrão através do qual entendemos, analisamos e modificamos o mundo exterior. Pessoas que
padecem do déficit pessoa, histórico ou social, geralmente amargam experiência
de marginalização e exclusão, pois na
maioria das vezes, são pessoas que não acreditam
em si mesmas, que se acham uma negação e por isso, para tentar driblar, usa de
meios não muitos legais. O autoconhecimento ou superação de si, dar-se na
eliminação de todo distanciamento e sentimento
de inferioridade ou superioridade. Somos iguais, apenas diferentes e com papeis
diversos na sociedade. Certamente a solidão machuca e fere, mas nem por isso se
deve exalar espinhos e exigir retratação de todos. Essas pessoas reagem como em
auto-boicote, isto é, a auto-justificação e a necessidade de aprovação, muitas
vezes, acaba por sufocar e não permitir a ação livre dos outros.
Certamente não é
fácil acolher as próprias cicatrizes como parte integrante do desenvolvimento,
afinal elas deformam, mas somente integrando-as no contexto geral que se pode
caminhar com equilíbrio e com a imparcialidade necessária para lidar com
situações adjacentes. Quando não se permite curar, a válvula escapatória,
geralmente acontece na mania de reconhecimento, de autoafirmação, de imposição
das próprias ideias e figura, ou seja, transforma a convivência numa cartilha
operacional da necessidade de auto-justificação e auto-explicação. Sou assim
por isso, por aquilo, por aquela situação, por aquela pessoa, mas realmente se
quer sair e superar essa situação, ou não será que esse vínculo acaba por
ofertar vantagens e utilidades que um amadurecimento não mais prestaria? As
pessoas se acostumam com as suas questões, lamentam-se, mas não se esforçam
para se retirarem delas. Não se menospreza todo o peso das vicissitudes, mas
para uma direção nova é preciso a coragem da ruptura. Perder? Toda escolha é
uma perda, mas é um ganho também. O que não se pode é continuar a lamúria e
achar que os outros devem arcar com o preço de suas limitações. O autoconhecimento leva a autonomia e
liberdade, não a altivez, prostração e ditadura. Na verdade, não existe um
critério único ou uma receita, mas cada pessoa deve se perguntar o que
realmente espera e quer da vida, aceitar a parcela de contribuição da opção
feita e não permanecer choramingando e se acostando nas migalhas que venham a
borbulhar das mesas de quem lutou para comer o pão que mais lhe agrada. A
responsabilidade social é um dever, mas não se pode reduzir uma caminhada em
exigir e constituir direitos. Caso a meta seja a felicidade e não a satisfação social, toda a engrenagem mudaria de
perspectivas.