A falsa ideia da liberdade.
O que é essa tal de
liberdade? Nem sei bem o que é, mas o que me faz ser eu mesmo. Tenho até receio que tenha uma falsa ideia da
liberdade. Esse sonho de desvinculação que é impossível à condição humana, mas
que deve ser o alento de todos os viajantes para a terra da felicidade. Eu caminho
para ser livre! Parece utópico e pouco realista. Os limites, as pressões, as
conveniências estão sempre nos determinando. Mas é possível ser você mesmo.
Tenho consciência de que sou fruto de tudo que vivi, das alternativas e
possibilidades que encontro, mas também de meus propósitos e disposições. Não
atrelar a felicidade a coisas ou pessoas ou até situações, isso é liberdade. A
liberdade é o meu sobrenome, é o que mais me identifica e o que mais me fascina
na condição de peregrinos que nos encontramos. Liberdade é capacidade de
autodeterminação, de autonomia, mas de responsabilidade também. Cada gesto ou
escolha livre carrega consigo direitos e deveres, assim como se tem uma
renúncia e um preço em cada atitude livre. Não viver na busca de reconhecimento
e consolidar propriedades e bens parece loucura. Mas prefiro ser louco a ser
capacho. Hoje me sinto mais tranquilo, mais solto e mais feliz quem sabe, pois
a necessidade é a mãe de toda escravidão. E quando percebi que tudo não passava
de uma saudável brincadeira que reação? Cair no desespero e continuar a viver
se arrastando ou saltar na liberdade, sem medo de pagar pela escolha. Por isso
que sendo peregrino de um abraço, não me canso de caminhar, ainda que essa
condição venha requerer disposição, desapego e contínua capacidade de mudança.
A renovação não é uma opção, mas a norma de quem preza pela própria vontade de
circular sem restrições. Uma vida que se constitua como dependência não é uma
vida, mas um arremedo. Escarafunchar para demonstrar o sentido de certos
princípios não é razão, mas imposição de uma realidade. Não confiar ou querer
confinar a que se diz amar, não passa de uma apropriação. A tentação do domínio
é real, mas somente quem é livre é capaz de viver sem querer dar satisfação. Viver
de modo consciente, coerente com as escolhas, mas sem ser submetido a dar satisfação
e justificação de tudo que faz ou vive a quem quer que seja é o máximo da áurea
liberdade. Não me arrependo nem dos meus erros, eles que me amadureceram e me
tornaram o que hoje sou. Ser livre é se dar conta dos erros, assumi-los como próprios
e integra-los na própria historia. Renegar ou rejeitar é atitude de
infantilidade ou de escravo. Quem é senhor de si não tem medo das consequências
do que se vive e nem delega a outros o peso que deve carregar. A nossa vida é
com os outros, no meio do mundo, entre muitas configurações, mas a decisão sobre
ela e com a vivemos depende de cada um, de modo irrenunciável. Os escravos
buscam sempre um modo de atribuir aos outros as suas desgraças e de culpa-los
por não serem felizes, já as pessoas livres fazem de cada desgraça uma ocasião de
exercerem a sua independência das limitações e de não paralisarem perante as
barreiras, mas continuam viajantes na busca desse chão de sentido e de encontro. E se filosofar é
aprender a morrer (Montaigne), ser livre é aprender a existir para ser o que se
deseja ser.