A morte
Não se pode olhar de frente
nem o Sol nem a morte", afirmou La Rochefoucauld no século XVII. Olhar o
Sol ofusca a vista; encarar a morte perturba a vida. Assim o pensador francês
acredita que vida e morte se acham completamente separadas. Mas os antigos
pensavam de outro modo. Tanto é que entendiam a Filosofia como uma longa
meditação sobre a morte. Preocupar-se em morrer, julgava Platão na Grécia do
século IV A.C., era uma boa via para filosofar. Em seu diálogo Fédon, ele
retrata Sócrates na prisão, à espera do momento em que terá de beber a cicuta.
Rodeado de amigos, com eles Sócrates debate sobre uma questão que se faz
presente e se mostra inadiável: a morte.
Surpreendendo por sua
serenidade e perspicácia, ele sustenta que o corpo se apresenta como um
princípio de divisão; é próprio de sua essência ser múltiplo (órgãos, tecidos,
células) e ter múltiplas necessidades e desejos (fome, sede, sono). Quem se
submete à sua lei, curvas e às contingências do mundo sensível. Mas é possível
construir a vida de outra maneira, ao adotar-se um princípio de unidade.
Escolher a Filosofia é converter-se ao mundo inteligível, não para desertar o
sensível, mas para habitá-lo segundo o que é verdadeiro e necessário. Com seus
argumentos, Sócrates não procura mostrar que ele estará vivo amanhã, depois de
executada a sentença de morte; ele quer fazer ver que hoje já é imortal, porque
vive em consonância com o espírito.
Na Antiguidade
greco-romana, de várias formas, a morte aparece imbricada à vida. O filósofo
Michel Serres bem mostra que, no paganismo, se está diante de outra maneira de
pensar, agir e sentir. Ele faz ver que, etimologicamente, o termo pagão (em
latim, paganus, que significa
camponês) provém do vocábulo latino pagus, que deu origem também às palavras
país e paisagem. Pagus queria dizer campo de lavoura; e tanto podia designar um
campo de trigo como um pedaço de vinhedo ou uma pequena horta. Cada pagus, cada
campo de lavoura, possuía algo sagrado: o espírito que o governava; e este era
o ancestral que nele havia sido enterrado. Isso garantia que determinado pagus
fosse propriedade de determinada família, mas também assegurava que este pagus
constituísse o lugar dos ritos que essa família realizava. Enterrar os corpos
dos seres amados tornava a terra sagrada; em contrapartida, devolver à terra os
corpos dos ancestrais fazia que eles mesmos se tornassem sagrados, pois se
acreditava que o homem (termo que deriva do latim homo) era nascido da terra.
Nessa época, era costume construir as casas ao lado dos túmulos; era habitual
entender a vida e a morte como intimamente ligadas.
Foi o cristianismo que
introduziu a noção de sacralidade da vida; foi então que se passou a concebê-la
como um dom de Deus a ser preservado. Pondo-se no lugar da Filosofia, a
Religião aparece agora como aquilo que traz reconforto e consolo. Ela conta
que, numa manhã de domingo, as mulheres se dirigiram ao sepulcro levando
bálsamos e ataduras, com o intuito de mumificar o cadáver que lá jazia.
Escolher a Filosofia
é converter-se ao mundo inteligível, não para desertar o sensível, mas para
habitá-lo segundo o que é verdadeiro e necessário. Mas,
ao chegar, já não encontraram o corpo morto. Jesus havia ressuscitado; era o
domingo de Páscoa. Ao promover o sepulcro vazio, o cristianismo faz da ressurreição
de Cristo uma de suas celebrações mais importantes. E assim transforma
radicalmente a maneira que se tinha de perceber a morte. Tanto é que prega que
deixem os mortos enterrarem os mortos, que se esqueça a morte e se viva a vida,
pois o que se chama de morte nada mais é do que uma passagem para se alcançar a
verdadeira vida
Durante o longo período da
Idade Média, algumas práticas pagãs ainda se mantêm, enquanto outras
desaparecem. Por algum tempo, os santos eremitas continuam a ponderar sobre a
morte, cultivando uma espécie de ars moriendi. Nessa direção, são notáveis as
representações de São Jerônimo. O tradutor da Bíblia para o latim, que no
século IV se retirou para o deserto, é visto cercado de livros e tendo por
única companhia um leão, a meditar numa gruta em face de uma caveira. Em cont
rapar t ida, desaparece por completo o direito de morrer, que a Antiguidade
greco - romana prezava e reconhecia, e extingue- se a prática dos antigos, que
permitia ao doente desesperançado pôr fim à própria vida, contando por vezes
com o auxílio de outrem.
EMERGE
O HOMEM
Mas é somente nos tempos modernos que se passa a pensar vida e morte como nitidamente opostas. E isto não causa surpresa. Com a modernidade, aprofundam-se velhos dualismos e novos se instauram. Nós, "senhores e possuidores da natureza", como dizia René Descartes (1596-1650), nos afastamos do mundo e dele nos diferenciamos. Entendendo que "saber é poder", como dizia Francis Bacon (1561-1626), ao mundo nos opomos e sobre ele queremos exercer nosso controle e domínio. Nós nos convertemos em sujeito e, pelo mesmo movimento, convertemos tudo o mais em objeto. Apreendemos o que existe como aquilo sobre o qual podemos ter idéias; captamos o próprio mundo como se ele apenas existisse na medida em que pudéssemos representá-lo. Pondo-nos dessa maneira em relação ao mundo, nos trazemos para a cena, ou melhor, nós nos colocamos como a cena em que doravante o mundo terá de se apresentar. Assim começa o reino do humanismo; como diria Heidegger, o homem se torna o centro de referência para o mundo e a região mesma de onde procede toda e qualquer medida. E, ao lado das separações que se estabelecem entre homem e mundo, cultura e natureza, sujeito e objeto, outras se instalam e se consolidam no próprio homem: alma e corpo, espírito e instintos, consciência e impulsos, razão e paixões.
Mas é somente nos tempos modernos que se passa a pensar vida e morte como nitidamente opostas. E isto não causa surpresa. Com a modernidade, aprofundam-se velhos dualismos e novos se instauram. Nós, "senhores e possuidores da natureza", como dizia René Descartes (1596-1650), nos afastamos do mundo e dele nos diferenciamos. Entendendo que "saber é poder", como dizia Francis Bacon (1561-1626), ao mundo nos opomos e sobre ele queremos exercer nosso controle e domínio. Nós nos convertemos em sujeito e, pelo mesmo movimento, convertemos tudo o mais em objeto. Apreendemos o que existe como aquilo sobre o qual podemos ter idéias; captamos o próprio mundo como se ele apenas existisse na medida em que pudéssemos representá-lo. Pondo-nos dessa maneira em relação ao mundo, nos trazemos para a cena, ou melhor, nós nos colocamos como a cena em que doravante o mundo terá de se apresentar. Assim começa o reino do humanismo; como diria Heidegger, o homem se torna o centro de referência para o mundo e a região mesma de onde procede toda e qualquer medida. E, ao lado das separações que se estabelecem entre homem e mundo, cultura e natureza, sujeito e objeto, outras se instalam e se consolidam no próprio homem: alma e corpo, espírito e instintos, consciência e impulsos, razão e paixões.
FUGA DA MORTE
Nesse contexto, o homem ocidental, aos poucos, começou a expulsar a morte de sua vida cotidiana. Em seu livro Ensaios sobre a história da morte no Ocidente, o historiador Philippe Ariès examina com minúcia a passagem, lenta e progressiva, da morte familiar na Idade Média para a morte reprimida e proibida nos nossos dias. Defende a posição de que, ao considerar a morte um acontecimento excepcional, o Ocidente caiu na tentação de dela fugir.Não causa surpresa, pois, que, no século XVII, com Francis Bacon, a questão da eutanásia tenha migrado para o domínio da medicina; passouse a usar o vocábulo para expressar a idéia de que cabia ao médico aliviar os sofrimentos dos doentes, tanto para curá-los quanto para proporcionarlhes uma morte tranqüila. Com o direito moderno, porém, a eutanásia assumiu caráter criminoso, uma vez que viola a proteção irrecusável da vida. Concebendo-se a vida como o bem jurídico mais valioso, o bem inalienável e intransferível por excelência, entendeu- se que ela era o direito primeiro da pessoa humana, direito esse que se devia proteger acima de todos os demais. Tutelado pelo Estado até contra a vontade do indivíduo, julgou-se tratarse de um direito absolutamente indisponível. Excluindo-se o seu contrário, converteu-se, então, o direito de viver em deverA meu ver, hoje nos encontramos numa situação paradoxal. De um lado, testemunhamos a banalização da morte. Em nossa vida cotidiana, dela ouvimos falar e nela falamos o tempo todo. A morte aparece como fenômeno biológico, ao lado das outras fases da vida: o nascimento, a puberdade, a maturidade e a velhice. Ela surge como fenômeno social, quando nos referimos a taxas de natalidade e taxas de mortalidade. Apresenta-se como fenômeno determinante para a demografia, na medida em que discutimos o decréscimo ou o aumento da população em diferentes regiões do planeta. Para a medicina, a morte se mostra como fenômeno letal, que tem de ser previsto e explicado; para o direito, ela se enquadra como fenômeno natural, que deve produzir documentos como certidões de óbito.
Nesse contexto, o homem ocidental, aos poucos, começou a expulsar a morte de sua vida cotidiana. Em seu livro Ensaios sobre a história da morte no Ocidente, o historiador Philippe Ariès examina com minúcia a passagem, lenta e progressiva, da morte familiar na Idade Média para a morte reprimida e proibida nos nossos dias. Defende a posição de que, ao considerar a morte um acontecimento excepcional, o Ocidente caiu na tentação de dela fugir.Não causa surpresa, pois, que, no século XVII, com Francis Bacon, a questão da eutanásia tenha migrado para o domínio da medicina; passouse a usar o vocábulo para expressar a idéia de que cabia ao médico aliviar os sofrimentos dos doentes, tanto para curá-los quanto para proporcionarlhes uma morte tranqüila. Com o direito moderno, porém, a eutanásia assumiu caráter criminoso, uma vez que viola a proteção irrecusável da vida. Concebendo-se a vida como o bem jurídico mais valioso, o bem inalienável e intransferível por excelência, entendeu- se que ela era o direito primeiro da pessoa humana, direito esse que se devia proteger acima de todos os demais. Tutelado pelo Estado até contra a vontade do indivíduo, julgou-se tratarse de um direito absolutamente indisponível. Excluindo-se o seu contrário, converteu-se, então, o direito de viver em deverA meu ver, hoje nos encontramos numa situação paradoxal. De um lado, testemunhamos a banalização da morte. Em nossa vida cotidiana, dela ouvimos falar e nela falamos o tempo todo. A morte aparece como fenômeno biológico, ao lado das outras fases da vida: o nascimento, a puberdade, a maturidade e a velhice. Ela surge como fenômeno social, quando nos referimos a taxas de natalidade e taxas de mortalidade. Apresenta-se como fenômeno determinante para a demografia, na medida em que discutimos o decréscimo ou o aumento da população em diferentes regiões do planeta. Para a medicina, a morte se mostra como fenômeno letal, que tem de ser previsto e explicado; para o direito, ela se enquadra como fenômeno natural, que deve produzir documentos como certidões de óbito.
Então, por que a morte é
sempre vista como uma espécie de escândalo? Por que ela enseja ao mesmo tempo
horror e curiosidade? É certo que a morte, esse acontecimento banal, aparece
como um fato dentre outros; um fato que o jornalista relata, o médico legista
constata, o biólogo analisa, o policial investiga. Mas, por outro lado, um fato
que não tem igual, um fato ímpar, desmedido e incomensurável. Não podemos
deixar de constatar que a morte é um mistério; não temos como nos proteger de
seu caráter vertiginoso e desconcertante. É por isso, aliás, que tanto falamos
nela e dela tanto ouvimos falar.
Os homens falam mais do que
menos conhecem. E assim como falam da morte, também falam do amor. Não é por
acaso que a sempre nova banalidade da morte, de algum modo, se assemelha à
antiga novidade do amor. Eros, o deus grego, quando atinge
A morte é um
mistério. Por isso, falamos tanto nela. Os homens falam mais do que menos
conhecem. E assim como falam da morte, também falam do amor. o coração dos seres humanos, neles desperta um sentimento único.
Representado como uma criança a brincar com seu arco-e-flecha, ele vem lembrar
que o amor é sempre inédito para aqueles que o vivem. De igual modo, a morte.
Toda vez que ela se faz presente é como se fosse a primeira vez. Por mais que
se repita a experiência em nossas vidas, com ela não nos acostumamos. Daí, essa
mistura de familiaridade e estranheza que a morte provoca em nós.
Contudo,
hoje a morte não é vista como um ganho, mas como uma perda. Nos tempos
modernos, ela se tornou um tema a ser evitado. Inexorável, representou para o
homem, que se queria senhor e dominador da natureza, o maior desafio. Obrigou-o
a deparar-se com a própria fragilidade; coagiu-o a defrontar-se com a finitude.
Nos nossos tempos, a situação todavia se agrava. Na sociedade em que vivemos, o
ser humano que está à morte é tido por um insucesso. Nesta sociedade que
preconiza a produtividade e o lucro, que prega a eficácia a qualquer preço, que
promove o espírito de competição e a lógica da exclusão, o moribundo é visto
como um malogro.
ACEITAR
A FINITUDE
Mas por que não perseguir a idéia de que, numa outra sociedade, todo ser humano teria assegurado o seu direito a uma morte digna, porque veria antes respeitado o seu direito a uma vida digna? Então, o homem não mais desempenharia o papel de dominador da natureza, mas abandonaria a posição privilegiada que durante séculos acreditou ocupar. Ele não mais se imporia como um sujeito em face da realidade, mas se converteria em parte do mundo. Aceitando sua humana condição, com tudo o que nela há de frágil e finito, ele não mais pensaria a vida e a morte como termos excludentes.
Mas por que não perseguir a idéia de que, numa outra sociedade, todo ser humano teria assegurado o seu direito a uma morte digna, porque veria antes respeitado o seu direito a uma vida digna? Então, o homem não mais desempenharia o papel de dominador da natureza, mas abandonaria a posição privilegiada que durante séculos acreditou ocupar. Ele não mais se imporia como um sujeito em face da realidade, mas se converteria em parte do mundo. Aceitando sua humana condição, com tudo o que nela há de frágil e finito, ele não mais pensaria a vida e a morte como termos excludentes.
Já no século XIX,
pensadores como Freud e Nietzsche apontam nessa direção. Nietzsche advoga a
tese de que o corpo constitui uma multiplicidade. Consistindo numa pluralidade
de adversários, tanto no que diz respeito às células quanto aos tecidos ou
órgãos, ele é animado por combate permanente. Até o número dos seres vivos
microscópicos que o compõe muda sem cessar, dado o desaparecimento e a produção
de novas células. No limite, a todo instante qualquer elemento pode vir a
predominar ou a perecer. Justamente por ser a luta o seu traço fundamental,
"a vida vive sempre às expensas de outra vida". A cada momento,
"nossa vida, como toda vida, é ao mesmo tempo uma morte perpétua".
Freud, por sua vez,
defende a idéia de que não acreditamos na nossa própria morte, pois estamos
convencidos no nosso inconsciente de que somos imortais. Tudo se passa como se
a morte acontecesse por acaso; insistimos em falar em acidente, doença,
infecção e até velhice. Evitando enfrentar que a nossa morte tem caráter
necessário, corremos o risco de empobrecer a nossa vida; para bem viver, é
preciso aceitar que mais dia menos dia vamos morrer.
É bem verdade, como
sustenta Jankelevitch em seu estudo de envergadura sobre A morte, que o
instante mortal é um acontecimento incomparável que não permite qualquer
conceitualização. A morte, quando advém, é literalmente extra ordinem, uma
ordem extraordinária. Uma lâmina de vidro translúcida separa o além do aquém.
Basta um coágulo de sangue numa artéria, um espasmo do coração, para que o além
se torne aquém. E bruscamente o vazio se instala no ser.
RUPTURA
No curso de nossas vidas, passamos por mudanças e transformações; amadurecemos e envelhecemos. Mas essas são alterações que ocorrem num continuum. A morte, ao contrário, é uma alteração súbita e descontínua. Ponto de ruptura, ela interrompe a continuidade; faz cessar a própria possibilidade de mudança ou transformação. Como dizia Epicuro, a morte não se acha na temporalidade da vida. Ela não nos diz respeito, porque, quando aí estamos, ela não se apresenta e, quando se faz presente, nós já não estamos mais. No limite, a morte não concerne nem os vivos nem os mortos. Isso não significa, porém, que se deva adotar o referencial moderno, que considerou vida e morte termos excludentes. É bem verdade que não podemos falar da morte enquanto instante mortal, porque a vida não nos fala do nada - ela só nos fala da vida. Mas, a meu ver, nós podemos pensar na morte como instante de vida. E isso de três perspectivas distintas: a partir de um exame de diferentes culturas; a partir de considerações acerca da história; a partir da pergunta pelo sentido da vida.
No curso de nossas vidas, passamos por mudanças e transformações; amadurecemos e envelhecemos. Mas essas são alterações que ocorrem num continuum. A morte, ao contrário, é uma alteração súbita e descontínua. Ponto de ruptura, ela interrompe a continuidade; faz cessar a própria possibilidade de mudança ou transformação. Como dizia Epicuro, a morte não se acha na temporalidade da vida. Ela não nos diz respeito, porque, quando aí estamos, ela não se apresenta e, quando se faz presente, nós já não estamos mais. No limite, a morte não concerne nem os vivos nem os mortos. Isso não significa, porém, que se deva adotar o referencial moderno, que considerou vida e morte termos excludentes. É bem verdade que não podemos falar da morte enquanto instante mortal, porque a vida não nos fala do nada - ela só nos fala da vida. Mas, a meu ver, nós podemos pensar na morte como instante de vida. E isso de três perspectivas distintas: a partir de um exame de diferentes culturas; a partir de considerações acerca da história; a partir da pergunta pelo sentido da vida.
Ao examinar diferentes
culturas, notamos que o homem desde sempre lutou contra a morte. Impulsionado
pelo desejo de tornar-se imortal, quis deixar vestígios de sua existência na
Terra. Mas, à medida que descobria que a morte era inevitável, ele se tornava
mais humano. Tanto é que, no Egito antigo, o homem desenvolveu sofisticadas
técnicas de construção de túmulos e conservação de cádaveres; na Roma antiga,
aprimorou a arte da escultura, para perpetuar o semblante dos seus imperadores;
em vários momentos e lugares, esmerou-se em erigir monumentos funerários.
Aliás, é justamente por meio do caráter singular de suas sepulturas e ritos
fúnebres que as culturas se diferenciam. Desse ponto de vista, a morte é ao
mesmo tempo nosso destino como seres finitos e nossa origem como seres humanos.
Ela é o nosso fim e o nosso começo.
Para Epicuro, a morte
não nos diz respeito, porque, quando aí estamos, ela não se apresenta e, quando
se faz presente, nós já não estamos mais. Ao
considerar o tempo histórico, percebemos que a existência das sociedades como a
dos indivíduos encontra os seus limites entre o nascimento e a morte. Se a
memória individual aparece como o reverso do esquecimento, a história, essa memória
milenar e coletiva, se desenrola sobre um fundo de nada. Do mesmo modo que os
continentes parecem flutuar no oceano como se fossem ilhas, a nossa vida na
qualidade de seres sociais está cercada pela eternidade primordial e pela
eternidade terminal.
SENTIDO DA VIDA
Por fim, ao refletir sobre a morte, nós nos defrontamos com a pergunta pelo sentido da vida, pois pensar que vamos morrer incita a meditar sobre a contingência do nosso ser; pensar que vamos deixar de existir leva a ponderar sobre o fato de que nem sempre existi e poderia não ter existido. Não é por acaso que o escritor romeno Emil Cioran (1911-1995) atribuía às enfermidades uma "missão filosófica"; no seu entender, elas dão ao homem plena consciência de sua existência, a qual não teria sentido algum se a morte não se enlaçasse perpetuamente à vida. A morte, esse fato bruto, esse "não sei o quê", deixa entrever a passagem do ser ao nada. Por isso mesmo, ela vem pôr em causa o sentido da vida. De modo lento ou abrupto, com violência ou suavidade, ela propõe ao homem, num instante, o desafio de pensar a sua própria condição.
Por fim, ao refletir sobre a morte, nós nos defrontamos com a pergunta pelo sentido da vida, pois pensar que vamos morrer incita a meditar sobre a contingência do nosso ser; pensar que vamos deixar de existir leva a ponderar sobre o fato de que nem sempre existi e poderia não ter existido. Não é por acaso que o escritor romeno Emil Cioran (1911-1995) atribuía às enfermidades uma "missão filosófica"; no seu entender, elas dão ao homem plena consciência de sua existência, a qual não teria sentido algum se a morte não se enlaçasse perpetuamente à vida. A morte, esse fato bruto, esse "não sei o quê", deixa entrever a passagem do ser ao nada. Por isso mesmo, ela vem pôr em causa o sentido da vida. De modo lento ou abrupto, com violência ou suavidade, ela propõe ao homem, num instante, o desafio de pensar a sua própria condição.
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