Silêncio
existencial
Cada um é o que é,
e não pode fugir dessa facticidade. O que faz que a nossa vida seja maravilhosa
é o seu mistério. Somente pode ser feliz que encara a vida com estupefação,
entusiasmo e desejo de descoberta. Se é verdade que não podemos mudar a nossa
estrutura, também é verdade que podemos mudar o nosso modo de lidar com a
realidade. As vezes a dureza do presente nos entristece, mas a descartabilidade
do tempo nos permite mergulhar em novas aventuras e embrenhar por outras
descobertas que permitem novamente sonhar, respirar e buscar. O nosso paradoxo
se assenta entre a impossível felicidade e a investigação de um possível
recomeço. As perguntas, as interrogações e as reticências são pistas que
apontam para uma liberdade que se concretiza na responsabilidade e na
inconstante verdade de hoje. E o que
dizer do vazio? Por que esse descontinuo sossego seguido de um continuo
silêncio? Questões de uma natureza ferida que acredita poder se salvar
eximindo-se do território do Absoluto…. No momento resta o colocar-se em
caminho!
Podemos fingir que
não notamos as ausências e as necessidades, podemos até nos enganar e achar que
somos felizes, mas o que existe é uma acomodação e aceitação da própria
condição de ser itinerante, errante e mendigo, como coisa normal e como dado
insuperável da existência humana. Por isso, muitos se alienam em bebidas,
poderes, religiões, drogas, seduções, maldades e também em ativismos, para não
se pensar na própria condição. É muito mais fácil ser ingênuo ou disfarçar do
que pensar, assim muitos morrem sem mesmo ter tentado aprofundar a dinâmica da
própria vida. Confundimos, tantas vezes, realização ou satisfação
temporária como modo de ser, ou seja,
muitos acreditam que o bem-estar seja felicidade e ignoram as perguntas do
próprio coração.
Tantos de nós
vivemos como que embriagados com a própria situação e reduzimos o próprio mundo
em possibilidades de concretizarmos os sonhos e nos esquecemos da ironia que é
o nosso mesmo estar-no-mundo; quantas pessoas preferem ser banais e
superficiais a se colocarem a pergunta sobre o futuro ou o amanhã? Quantos
decidem por ignorar que a doença, o acidente e a morte são paisagens presentes
no horizonte de todos e de quaisquer um? Mas também muitos se amedrontam e se
paralisam diante da fatalidade do que existe e passam a vida em brancas nuvens.
Diversos de nós perdemos a noção do sentido da vida e transformamos as experiências em atos fugazes e
desesperados de satisfação. Há uma corrida desenfreada para garantir um lugar
ou um estado, quando apenas existem possibilidades e hipóteses. Perdemos tempos
em cogitações pretenciosas e deixamos escorrer a brisa que pode nos tirar do
desengano da caducidade do que se pretende ser. Morremos para conquistar o
nosso espaço e atropelamos os átimos de felicidades que poderíamos gozar e por
isso mesmo nos suicidamos inconscientemente e pensamos que buscamos a os nossos
significados. Cada um é o dicionário de si mesmo, toda pretensão de conhecer o
outro é apenas a tentativa de reconhecer-se em algo ou em alguém.
Sentimos
dessabores e anulamos seus efeitos com outros gostos, e isso é ser contente?
Não ter desavenças ou divisões externas garante a serenidade de alguém?
Procurar, conquistar e manter a estabilidade e o sucesso pessoal, seria isso
felicidade? Proceder de modo organizado, harmônico e racional e ter um conceito
positivo e alto diante dos outros, acaso seria isso o ideal de uma vida humana?
Temos medo de sermos nós mesmos e queremos ser anjos, deuses, demônios, bestas
e até máquinas e assim barbarizamos o que não controlamos e nos sentimos mais
aliviados, e isso é praticar a liberdade? A pressa que temos de sanar os
problemas e construir proteção, seria isso a lógica da independência de ser?
Tantas vezes queremos impor nossas loucuras e neuroses aos outros para não nos
reconhecermos deficientes. O futuro, porém, continua aberto, e isso se ele
existir. E se posso ser útil e viver com dignidade, já transcendo o nada e respiro o odor de eternidade!
Jorge Ribeiro
Julho 2014
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