Patristica Latina (parte I)

A patrística Latina


Gilson, E., História da filosofia cristã, 130ss.

Inicia-se com as Epístolas de São Paulo e o Evangelho de São João. A Patrística vem dos apóstolos Paulo e João e também de Padres da Igreja, que foram os primeiros dirigentes espirituais e políticos da Igreja após a morte dos apóstolos. Com o desenvolvimento do cristianismo, tornou-se necessário explicar seus preceitos às autoridades romanas e ao povo. Não podia ser pela força, mas tinha que ser pela conquista espiritual. Os primeiros pensadores padres elaboraram textos sobre a fé e a revelação cristã. Buscaram conciliar o cristianismo ao pensamento filosófico dos gregos, pois somente com tal conciliação seria possível convencer e converter os pagãos da nova verdade. Tenta basear a fé em argumentos racionais. 

A filosofia patrística tem a tarefa de evangelizar e defender a religião cristã contra os ataques teóricos e morais do pensamento antigo. A filosofia patrística introduz idéias novas: a criação do mundo por Deus, pecado original, Deus e a trindade una, encarnação e morte de Deus, juízo final, ressurreição, origem do mal. As idéias cristãs eram impostas pelos Padres por meio das verdades reveladas  por Deus, eram verdades irrefutáveis e inquestionáveis: os dogmas. O grande tema de toda a filosofia patrística era conciliar razão e fé. 

A filosofia patrística no Ocidente se desenvolve principalmente no norte da África, em torna da região de Cartago, província romana cujas condições de paz e prosperidade propiciam o florescimento da cultura literária, filosófica e teológica.
Tratando-se de filosofia patrística, não devemos, como outrora, pensar somente nas obras de filósofos que só foram filósofos. A filosofia da patrística está antes contida nos tratados dos pastores de alma, pregadores, exegetas, teólogos, apologetas que buscam antes de tudo a exposição da sua doutrina religiosa. Mas ao mesmo tempo, levados pela natureza das cousas e dada a ocasião, se põem - a resolver problemas propriamente pertencentes à filosofia; e então, pela força do assunto, versam a metodologia filosófica (J. HIRSCHBERGER, 1966).

  1. TERTULIANO
Segundo Tertuliano, se levarmos em conta a individualidade dos membros da Igreja, todos estão sujeitos a erros. Nem mesmo o martírio, a mais bela profissão de fé, torna-os imune a ele. Exemplo disto é que o herege que se torna mártir não deixa de ser herege. Não devemos, portanto, julgar a fé pela pessoa, mas a pessoa pela sua fé.5 Com efeito, a pessoa não é livre para aceitar ou rejeitar a fé cristã, tampouco está em seu poder aceitar parte desta fé e rejeitar outra. Tertuliano entende que a aceitação integral da fé dispensa e proíbe aquele que a aceita de fazer livre exame dela.6 Podemos verificar, então, que o direito de prescrição, ao mesmo tempo que tolhe aos gnósticos fazer um uso indiscriminado das Escrituras, vincula os cristãos à tradição da fé, herdada dos seus antepassados. Por conseguinte, enquanto vinculados a uma tradição que se impõe por ser vetusta, os articula fidei também não admitem progressos, nem é possível fazer-lhes acréscimos ou subtrair-lhes o que quer que seja; caberá ao crente, pois, aceitar o credo tal como lhe foi transmitido e exposto.
Que tem a ver Atenas com Jerusalém? Ou a Academia com a Igreja? Ou os hereges com os cristãos? A nossa doutrina vem do pórtico de Salomão, que nos ensina a buscar o Senhor na simplicidade do coração. Que inventem, pois, se o quiserem, um cristianismo de tipo estóico e dialético! Quanto a nós, não temos necessidade de indagações depois da vinda de Cristo Jesus, nem de pesquisas depois do Evangelho. Nós possuímos a fé e nada mais desejamos crer. Pois começamos por crer que para além da fé nada existe que devamos crer (TERTULIANO. De Praescriptione Haereticorum).
  1. AMBROSIO
Suas exposições sobre o valor da virgindade provocaram um movimento religioso em toda a Itália. Renunciou a seus bens em favor da Igreja e dos pobres, levando vida ascética exemplar. Ele mesmo preparava os catecúmenos para o batismo, iniciava-os nas celebrações pascais, na compreensão dos ritos. Consagrava-se dia e noite aos deveres de seu ministério.Segundo o depoimento de Agostinho de Hipona:
Assim que cheguei a Milão, encontrei o bispo Ambrósio, conhecido no mundo inteiro como um dos melhores, e teu fiel servidor. Suas palavras ministra-vam constantemente ao povo a substância do teu trigo, a alegria do teu óleo e a embriaguez sóbria do teu vinho. (…) Comecei a estimá-lo, a princípio, não como mestre da verdade (…), mas como homem bondoso para comigo. Acompanhava assiduamente suas conversas com o povo, não com a intenção que deveria ter, mas para averiguar se sua eloquência merecia a fama de que gozava, se era superior ou inferior à sua reputação. Suas palavras me prendiam a atenção. (…) Eu me encantava com a suavidade de seu modo de discursar; era mais profundo, embora menos jocoso e agradável do que o de Fausto quanto à forma.
Bento XVI discorrendo sobre ele diz que Ambrósio: "Trouxe para o ambiente latino a meditação das Escrituras, iniciando no Ociente a prática da lectio divina, que orientou a sua pregação e os seus escritos, que brotam precisamente da escuta (…) da Palavra de Deus. (…) Com ele os catecúmenos aprendiam primeiro a arte de viver bem para preparar-se depois para os grandes mistérios de Cristo e sua pregação partia da leitura dos Livros Sagrados, para viver de conformidade com a revelação divina."

"Nessa leitura (…) onde o coração se esforça por compreender a palavra de Deus, se entrevê o método da catequese ambrosiana: a Escritura intimamente assimilada, sugere os conteúdos que se devem anunciar para converter os corações. (…) A catequese é pois, inseparável do testemunho de vida."1

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