O Santos e
Mártires: tesouros da Igreja
Por Pe. Jorge Ribeiro
Crer equivale a
professar a fé, o que significa redescobrir o caminho da fé para fazer brilhar
a alegria e o renovado entusiasmo do encontro com Cristo. Dessa maneira, como o
nosso tema propõe, “os santos
estão verdadeiramente vivos, porque vivos para Deus e em Deus e, portanto,
definitivamente vivos. O seu testemunho é essencialmente esse: viver vale a
pena, vale mesmo todas as “penas” pelas quais possamos passar, se vivermos
amando, pois só assim a vida se eterniza no Amor que Deus é – e se torna vida
em plenitude”.
A partir dessa assertiva e da presença que a figura dos santos imprimem
na vida dos crentes, pode-se afirmar que: “Os santos são o mais belo testemunho
humano do poder do amor. E, no dizer do Apocalipse, são «uma multidão que
ninguém pode contar» (cf. 7, 9). Santos escondidos, quase todos, conhecidos
apenas dos poucos que com eles conviveram. Santos reconhecidos pela Igreja –
mártires, confessores, homens e mulheres, pais e mães, crianças... – e apresentados
a todos como exemplo de vida cristã, ou seja, de vida levada no amor e por
amor, mesmo no meio das maiores dificuldades. Diante de tal multidão, quando
pensamos a sério no seu significado, é difícil não sentir algo ao jeito daquilo
que experimentava Santo Inácio de Loiola, antes da sua conversão, convalescendo
dos ferimentos sofridos em combate e lendo a vida dos santos: «Se eles fizeram
isto, porque não eu? Se eles, pecadores como eu, se deixaram vencer pelo Amor e
viveram amando, porque não eu?»”.
Da outra parte da nossa margem nos
impressiona a força e coerência das testemunhas qualificadas do Evangelho que
se entregam e se consomem até a ultima gota de suas existências, ou seja dos
mártires. Um ideal de assimilação com o
próprio Jesus na vida e na morte. O CCC
declara que: “O martírio é o supremo testemunho prestado à verdade da fé; designa um
testemunho que vai até a morte. O mártir dá testemunho de Cristo, morto e
ressuscitado, ao qual está unido pela caridade. Dá testemunho da verdade da fé
e da doutrina cristã. Enfrenta a morte num ato de fortaleza. "Deixai-me
ser comida das feras. E por elas que me será concedido chegar até Deus."
(2473).
Com o tempo, a Igreja foi
percebendo que havia um outro tipo de martírio, incruento, sem derramamento de sangue: o
martírio-testemunho de toda uma vida dedicada à fé e ao Evangelho, na aceitação
de afrontas e na dedicação aos pobres e sofredores. Será que o doente que
aceita a cruz da dor cotidiana não vive uma espécie de martírio em sua
identificação com o Cristo crucificado? Sem dúvida, pois o derramamento de
sangue não diminui a importância do heroísmo e da generosidade na vida cristã. O
ideal do martírio, dessa forma, se estende a todos os estados de vida:
religiosa, matrimonial, apostólica, profissional. O missionário, que vive sem
medo o perigo da perseguição, é um mártir. A mãe e o pai de um filho com
necessidades especiais, em sua generosidade e paciência, vivem o martírio. O
jovem que dá testemunho de sua fé num ambiente difícil, às vezes hostil para os
cristãos, também vive o martírio.
Qual o significado e o valor do
testemunho dos santos e dos mártires? O documento “porta fidei” diz que não
podemos aceitar que o sal se tore insipido e a luz fique escondida (cf. Mt 5,
13-16), ou seja, que devemos adquirir o gosto de nos alimentarmos da Palavra de
Deus e fazer dela o nosso sustento. Assim sendo, crer em Jesus Cristo é o
caminho para poder chegar definitivamente à salvação e ter fé para reavivar,
purificar, confirmar e confessar a própria fé. Isso nos impele a dizer que se
deve atualizar a fé para que essa não perca o seu valor e a sua beleza.
Mas para que reavivar e reconhecer
a beleza da fé? A fé é uma bussola segura que nos orienta no caminho que leva
ao Reino; desse modo os cristãos são chamados a fazer brilhar, com a sua
própria vida no mundo, a palavra de verdade que o Senhor Jesus nos deixou. E
esse é o testemunho e a figura presente dos santos e mártires, pois neles como
a todos nós a fé precisa ser atuada por meio do amor (cf. Gl 5, 6). É o amor de
Cristo que enche os nossos corações e nos impele a evangelizar, a abraçar novos
desafios e até a sacrificar a própria liberdade. Tal possibilidade vem somente
acreditando que a fé cresce e revigora, ou seja, que se experimenta a sua
beleza no abandonar-se nas mãos de um amor que se experimenta cada vez maior
porque tem a sua origem em Deus.
Renovar e
testemunhar a fé na renovada convicção, com confiança e esperança, rezando e
vivenciando as verdades do Credo. Esse é o nosso empenho no ano da fé e esse é
um dos objetivos nesse Congresso, porque a fé é decidir estar com o Senhor,
para viver com Ele, pois a fé é um ato de liberdade, a qual exige assumir a
responsabilidade social daquilo que se acredita.
Daqui o renovado
e sempre atual testemunho dos santos e mártires, os quais nos deixam um legado
e uma responsabilidade, de fato, desde a
antiguidade se afirma que “A glória da Igreja são seus mártires: homens,
mulheres, jovens e crianças que a tal ponto amaram a Jesus que não lhes
importou sofrer ou morrer. A perseguição que o Império romano moveu aos
cristãos, durante 300 anos, não os atemorizou ou diminuiu-lhes o número.
Tertuliano, grande teólogo, chegou a dizer: “O sangue dos mártires é semente de
novos cristãos”. (Confissões). Houve quem se atemorizasse e cedesse no momento
da perseguição, pois nem todos receberam a graça e a força para enfrentar o
martírio”.
Tudo isso deve
nos estimular a reavivar sinceramente a nossa fé e buscarmos ser perseverantes
até o fim, mesmo porque o martírio era e continua sendo uma prova imensa, pois supõe
imensos sofrimentos, angústias, torturas,
mas também decapitação, mutilação, ser entregue a animais ferozes nos circos,
ser queimado, enfim, ser levado à morte física. Santo Inácio de Antiorquia
(séc. II), antes de ser despedaçado na boca de leões e tigres, dizia:
“Triturado por leões, serei como o trigo que é triturado para com ele se fazer
o pão da eucaristia. Deixai-me ser pasto das feras”. Ele pode proclamar a sua
fidelidade a Deus e à sua Palavra porque ele se sentia membro da comunidade dos
fiéis, onde se evidencia que é na fé da comunidade cristã que cada um é inserido
na assembléia do crentes e esse conhecimento da fé introduz na totalidade do
mistério salvifico revelado por Deus.
Sabemos todos que
o longo da historia e do tempo devemos manter o olhar fixo sobre Jesus Cristo,
“autor e consumador da Fé” (Hb 12,2) pois n’Ele encontra plena realização toda
a ânsia e anelo do coração humano. Nessa linha que possamos constatar que pela
fé Maria, os apóstolos, os discípulos, os mártires e os homens e mulheres de
todos os tempos se doaram e testemunharam a alegria de acreditar ao Deus da
esperança e na sua presença real e viva no meio da humanidade e é pela fé que vivemos
também nós , reconhecendo o Senhor Jesus vivo e presente na nossa vida e na
historia.
A consequência
imediata da fé vivida é a caridade, pois a fé sem a caridade não dá frutos e a
caridade sem a fé seria um sentimento constantemente à mercê da dúvida. Se de
um lado é a fé que permite reconhecer Cristo e da outra parte é o seu próprio
amor que impele a socorre-Lo sempre que se faz próximo nosso no caminho da
vida.
Do que até agora
falamos se evidencia que a fé nasce do encontro com o Deus vivo, que nos chama
e se revela no amor e que a fé nos abre o caminho e acompanha os nossos passos
na historia. É verdade que a fé é a resposta a uma Palavra que interpela
pessoalmente, a um tu que nos chama por nome, mas é verdade também que a fé
entende que a Palavra quando é pronunciada pelo Deus fiel se torna a coisa mais
segura, pois o homem fiel recebe a sua força do confiar-se nas mãos do Deus
fiel.
Nessa perspectiva
vemos que a santidade, o martírio, o testemunho quotidiano são modos de por em
pratica a vida de fé, já que a fé consiste na disponibilidade de deixar-se
transformar sempre de novo pela chamada de Deus e assim é que vemos em nosso tempo, que o martírio
também é necessário. Um texto da Constituição Dogmática Lumen Gentium n.42 diz
que todos “devem estar prontos a confessar Cristo perante os homens, segui-lo
no caminho da cruz entre perseguições, que nunca faltam à Igreja”. O martírio
dos cristãos não é um fenômeno do passado, como na época do Império romano.
Pelo contrário, do ponto de vista histórico: a época dos mártires é a nossa!
Segundo um estudo estatístico do maior especialista de estatística religiosa
moderna, David Barret, os mártires cristãos, desde a morte de Jesus até nossos
dias, têm sido uns 70 milhões, mas, desses, 45 milhões (mais da metade) se
concentram no século XX e no que já se passou do século XXI”. A cada cinco
minutos, um cristão é assassinado por razão da sua fé. A cada ano, 105 mil
cristãos no mundo são condenados ao martírio: um verdadeiro holocausto, do qual
se fala muito pouco. O Beato João Paulo II já nos convidava a “refletir sempre sobre
o fato de que o século dos mártires foi o século XX e que este século de
martírio, que claramente teve alguns picos nos horrores do comunismo e do
nacional-socialismo, continua, no entanto, no século XXI”.
O reconhecimento
do testemunho dos santos e mártires são universalizados porque a fé é
discernida na comunidade, o que vem a significar que o ato de fé da pessoa
singular se insere na comunidade, no “nós” comum do povo, que na fé, é como um
único homem. A fé é um dom gratuito de Deus que pede a humildade e a coragem de
confiar e de se entregar a Ele para ver o luminoso caminho da salvação, ou
seja, a fé colhe no amor de Deus manifestado em Jesus o fundamento sobre o qual
apoia a realidade e a sua ultima destinação. Dessa maneira a vida de fé
enquanto existência filial, é reconhecer o dom original e radical que está na
base da existência do homem. A salvação
por meio da fé consiste em reconhecer o primado do dom de Deus, que seria o
mesmo que afirmar que a fé em Cristo nos salva porque é n’Ele que a vida de
abre radicalmente a um amor que nos precede e nos transforma de dentro, que age
em nós e conosco. Assim sendo, o crente é transformado pelo Amor, ao qual se
abriu pela fé, e no seu acolher esse amor que lhe é doado a sua existência se
dilata além de si mesmo, isso porque na fé o EU do crente se expande para ser
habitado por um Outro, para viver em um outro e assim a sua vida se alarga no
Amor. Isso vem a nos mostrar que o crente aprende a ver a si mesmo a partir da
fé que professa: a figura de Cristo é o espelho na qual ele descobre a própria
imagem realizada. Daqui o inserir do crente na comunidade, pois a fé tem uma
forma necessariamente eclesial, confessa-se desde o interno do Corpo de Cristo,
como comunhão concreta dos crentes, e como afirma o documento “porta fidei”, que “A fé não é um fato
privado, uma concepção individualista, uma opinião subjetiva, mas nasce da
escuta e é destinada a se pronunciar e a se tornar anúncio”.
Muitas vezes e de
tantos modos os cristão católicos são atacados e condenados por idolatria, são
acusados de fazer cultos pagãos, de adorar imagens ou outros deuses,
entretanto, a idolatria não calha nas devoções ou nas devoções que se tributa
aos santos, mas no apego às criaturas, como afirma o CCC ao dizer que: “A
idolatria não diz respeito somente aos falsos cultos do paganismo. Ela é uma
tentação constante da fé. Consiste em divinizar o que não é Deus. Existe
idolatria quando o homem presta honra e veneração a uma criatura em lugar de
Deus, quer se trate de deuses ou de demônios (por exemplo, o satanismo), do
poder, do prazer, da raça, dos antepassados, do Estado, do dinheiro etc.
"Não podeis servir a Deus e ao dinheiro", diz Jesus (Mt 6,24).
Numerosos mártires morreram por não adorar "a Besta", recusando-se
até a simular seu culto. A idolatria nega o senhorio exclusivo de Deus; é,
portanto, incompatível com a comunhão divina” ( §2113).
Configura-se,
assim, que a fé sem a verdade não salva, não torna seguro os nossos passos,
porque a fé é capaz de oferecer uma luz nova para seguir a estrada da
felicidade, pois é a fé que transforma a pessoa inteira, enquanto essa acolhe o
Amor, não é um amor apenas de sentimento, mas vida vivida. Entende-se que o
amor verdadeiro unifica todos os elementos da nossa pessoa e se torna uma luz
nova para uma vida plena. Como nos propomos neste congresso, conhecer mais e
melhor a nossa fé, porque o conhecimento da fé é conhecimento que ilumina um
caminho na história, dado que o conhecimento da fé ilumina o percurso
particular de um povo e de todo o mundo criado.
Dito isso podemos
deduzir que a luz da fé é aquela de um rosto no qual se vê o Pai, assim a
verdade que fé nos revela é centrada no encontro com Cristo, expressão visível do
Amor eterno do Pai, uma Luz que nos iluminando nos chama e quer se refletir no
nosso rosto para resplandecer de dentro de nós. Essa é a luz do amor, da
verdade, da fé. E o rosto dos santos, segundo a tradição bíblica, refletem o
esplendo do Evangelho, a luz da fé. Então, “o exemplo dos santos é um estímulo. Olhando-os, ou nos
deixamos ficar na mediocridade de quem não se arrisca a enfrentar o próprio
egoísmo, ou, fortalecidos pelo seu exemplo, nos deixamos surpreender pelo Amor
e vivemos sempre mais intensamente a nossa doação a Deus e ao próximo. Na
verdade, como lembrou Jesus (Marcos 12, 28-34), uma não vai sem a outra, o amor
a Deus não se entende sem o amor ao próximo concreto, aquele que vive connosco
cada dia; e o amor ao próximo só é verdadeiramente possível se nele nos
deixarmos surpreender pela presença de Deus. Na verdade, ou o próximo, a quem
amo, é maior do que eu, e me leva a sair de mim, despojando-me, para o acolher,
ou então não faço mais do que amar-me nele – suprema forma de egoísmo. Mas para
que o próximo seja maior do que eu, preciso de reconhecer nele uma Presença que
nos ultrapassa, a ele e a mim: Deus. É por isso que o «amor» do próximo sem
Deus nunca vai muito longe e é sempre condicionado. Os diversos materialismos
ateus estão aí para o testemunhar”.
A luz que brota
da adesão da fé é uma luz que nos faz humildes, empenhados com o mundo, porque
luz encarnada, esse é um caminho que passa pela confissão de um Deus que toma
conta de todos e que é possível encontra-Lo. A pessoa de fé se deixa guiar,
está pronto a sair de si para encontrar o Deus que surpreende sempre. Quem se
coloca em caminho para fazer o bem se avizinha a Deus, porque a fé é uma luz
que nos convida a partilhar e conhecer melhor aquilo que amamos. Destarte, a fé
precisa passar pela verificação da Palavra e da Comunidade, portanto, a fé reta
orienta a razão para se abrir à luz que vem de Deus, para que essa, guiada pelo
amor pela verdade, possa conhecer Deus de modo mais profundo. De consequência,
quem se abre ao amor de Deus e escuta a sua voz e recebe a sua luz, não pode
ter escondido tudo isso para si. A palavra recebida se faz resposta, confissão
e testemunho, pois essa é como uma luz que se espelha de rosto em rosto, ou
seja, o que chamamos de transmissão da fé, pois essa passa pelo tempo e pelas
gerações.
É impossível crer
sozinho, sendo assim, a igreja é uma mãe que nos ensina a falar a linguagem da
fé, a linguagem da comunhão e da solidariedade. Como afirma o Papa Francisco na
Lumem Fidei, quando diz que “A fé não
é uma opção individual, mas é uma abertura ao “nós” que se consuma ao interno
da comunidade da Igreja. É possível responder em “primeira pessoa” ao creio, à
fé, somente porque se pertence a uma comunidade grande, porque se diz “cremos”.
A fé tem necessidade de um âmbito onde possa testemunhar e comunicar, ou seja,
a comunidade dos crentes”.
A fé comunitária,
discernida na Igreja é a multidão dos fiéis que na fidelidade e perseverança
exalam o bom perfume do Cristo Encarnado, Vivo e atuante, quer dizer “A
multidão incontável de que fala o Apocalipse é constituída por gente «de todas
as tribos, povos e nações». No entanto, toda esta gente canta o nome de um só:
Jesus Cristo. Ele é a razão de ser dos santos – estes são-no porque viveram no
seguimento de Cristo, acolheram o seu Evangelho e deixaram-se converter por
Ele. Esta atitude nova perante a vida e, sobretudo, perante os nossos próximos
é a imagem de marca do cristão – muitas vezes atraiçoada, mas nunca desmentida.
Os santos não «inventaram» nada, simplesmente deram-se ao seguimento de Cristo,
segundo a originalidade humana de cada um. E neste seguimento entenderam aquele
«o Filho do Homem não veio para ser servido mas para servir e dar a vida em
resgate pela multidão» (Marcos 10, 45). Cada cristão encontra-se perante esta
alternativa: ser servido (desejar ser servido) ou servir (desejar servir). Da
sua opção depende não só o presente mas também o futuro, de modo particular, a
entrada na plenitude da vida. Poderá chegar diante de Deus apenas com o desejo,
mas é preciso que seja o desejo de servir – pois não se deseja servir e dar a vida
impunemente; mais tarde ou mais cedo, este desejo há de rebentar as amarras do
egoísmo, levando a vida a converter-se em doação – muito ou pouco, isso não
compete a ninguém julgar, nem ao próprio. Deus providenciará”.
Essa declamação
da comunhão dos santos nos autoriza afirmar que a transmissão da fé acontece
primeiramente por meio do Batismo, porque
no batismo a pessoa recebe também uma doutrina para professar e uma
forma concreta de vida que requer o envolvimento de toda a sua pessoa e o
encaminha verso o bem. O Batismo é a ação de Cristo que nos toca na nossa
realidade mais pessoal, transformando-nos radicalmente, tornando-nos filhos
adotivos de Deus, participantes da natureza divina. Assim, a natureza
sacramental da fé encontra a sua expressão máxima na Eucaristia. Essa é
nutrimento precioso da fé, encontro com Cristo presente de modo real com o ato
supremo de amor, o dom de Si mesmo que gera vida.
Declara a Lumem Fidei que “Na Eucaristia encontramos o encontro das
duas asas sobre as quais a fé percorre o seu caminho: a asa da história : é um
ato de memória, atualização do mistério; a outra asa nos leva a passar do
visível verso o invisível, ou seja, na Eucaristia aprendemos a olhar a
profundidade do real”. Essa constatação nos confirma quanto já dito, isto é,
que a fé é um caminho, uma estrada a seguir, aberta ao encontro o Deus vivente; então, a fé confessa o amor de Deus, origem e
sustento de tudo. Não um amor qualquer, mas o amor verdadeiro, que é a medida
do amor do fiéis e é essa a alegria da fé, a beleza da unidade de um único
corpo e dum único Espírito.
Sustentamos que a
fé é una porque se volta ao único Senhor, à vida de Jesus, à sua história concreta
que compartilha conosco, ou seja, a fé é una porque compartilhada por toda a
Igreja, que é um único corpo e um único Espírito e justamente porque uma só fé,
ela deve ser confessada em toda a sua integridade e pureza. A integridade da fé
é ligada à imagem da Igreja virgem, à
sua fidelidade no amor esponsal por Cristo, a unidade da fé é a unidade de um
organismo vivente. Dessa maneira, a fé se mostra universal, católica, mesmo
porque a sua luz cresce para iluminar todo o cosmo e toda a história.
A fé revela como
podem serem firmes os vínculos entre as pessoas, quando Deus se faz presente no
meios delas, pois o Deus da confiança doa à humanidade uma cidade confiante, a
igreja. Desse ponto de vista é licito dizer que a fé não é um refúgio para
gente sem coragem, mas a dilatação dessa vida, porque a história de fé, desde o
inicio, é a história da fraternidade, mesmo que muitas vezes se tenha
experimentado conflitos. Essa mesma fé nos ensina ver que em cada pessoa tem
uma bênção para mim, que a luz do rosto de Deus me ilumina por meio do rosto do
irmão: quer dizer, a fé afirma a
possibilidade do perdão, que necessita muitas vezes de tempo, de fadiga, de
paciência e de empenho. Como organismo vivo, a comunidade dos crentes é
iluminada pela própria crença, pois a fé ilumina o viver social.
Mas somos cientes
que falar da fé muitas vezes é falar de provas dolorosas, porque o cristão sabe
que o sofrimento não pode ser eliminado, mas pode receber um sentido, pode se
tornar ato de amor, entrega nas mãos de Deus que não nos abandona; e de outro
modo, a luz da fé não nos deixa esquecer os sofrimentos do mundo. Sabemos que a
fé não é luz que dissipa todas as nossas trevas, mas lâmpada que guia na noite
os nossos passos e isto basta para o caminho, quero apenas dizer que o
sofrimento nos recorda que o serviço da fé ao bem comum é sempre serviço de
esperança, que olha além do horizonte, sabendo que somente de Deus, do futuro
que que nasce de Jesus ressuscitado, pode encontrar fundamento sólido e durador
na nossa sociedade.
Cabe-nos nesse
momento uma pergunta que atravessa toda a nossa existência de crentes. Por que
crer? O tempo que vivemos revela, juntamente com as maravilhas nas novas
conquistas, um difundido sentido de crise, cuja raiz se aloja no terreno
empobrecido de uma grave aridez de ordem cultural, mas o dinamismo da fé nos
ajuda a ter confiança e visão positiva do futuro. A fé não é um analgésico que
nos preserva dos males, mas essa fé em Cristo constitui uma referência de
estabilização e de esperança para os cristãos e, por meio desses, para o mundo
inteiro. A fé, de fato, é uma rocha forte na qual se pode livremente aderir e
sobre a qual se pode construir serenamente a existência. Quando o homem
reconhece Deus e se confia a Ele percebe em si uma consistência que vem não
somente de suas forças. Tudo isso porque o verdadeiro crente descobre que não
vive mais sozinho: sente que Cristo é o seu novo principio vital, daqui a sua
estabilidade e a sua coragem para viver no mundo.
Os tesouros da
nossa fé, os santos e mártires, chamam-nos a entrar nesse mar profundo da fé
depositar nosso coração no único bem que nos leva à eternidade, Cristo Jesus.
Disso se infere que os mártires da fé, de ontem e de hoje, são aqueles
que entenderam que “quem ama a sua vida a perde e quem a odeia neste mundo a
conservará para a vida eterna” (Jo 12,25). O mundo contemporâneo rejeita e
despreza essas palavras de Cristo, fazendo do amor por si mesmo o critério
supremo da existência. Mas as testemunhas da fé nos falam com seu exemplo que
não consideraram o próprio bem-estar, a própria sobrevivência como valores
maiores que a fidelidade ao Evangelho. E, na sua fraqueza, deixam manifestar a
força de Deus, se opondo com extrema resistência ao mal. Na sua fragilidade, é
refletida a força da fé e da graça do Senhor. Pois o cristão sabe que ao se
decidir por seguir a Cristo não optou por um caminho fácil, mas pelo caminho
certo. Ele tem consciência de que no mundo teremos aflições de todos os tipos,
“mas coragem porque – diz Cristo – eu venci o mundo!”(Jo 16, 31). Somos
chamados a trilhar esse mesmo caminho. Pois os mártires da fé são os verdadeiros
campeões, são aqueles que chegaram ao pódio, levantaram a palma da vitória e
alcançaram a coroa incorruptível, e experimentaram em suas próprias vidas que a
“vitória que vence o mundo é a nossa fé! (cf. I Jo 5, 4).
PARA REFLETIR
1. O que significa para a Igreja a
vida de um mártir?
2. Quais são os mártires do nosso tempo?
3. Você conhece alguém que vive o martírio diário com generosidade?
2. Quais são os mártires do nosso tempo?
3. Você conhece alguém que vive o martírio diário com generosidade?
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