Liberdade,
angústia e sofrimento
Querer e não ter a
força para realizar, fazer algo e não ter a certeza de que seja a coisa melhor,
qual mistério ronda as nossas escolhas e as nossas ações, como um verdadeiro
emaranhado de desejos, necessidades e autodeterminação.
O que realmente
significa essa minha capacidade de decidir livremente sobre as decisões a
tomar, sobre os atos a cumprir ou sobre o não optar diante de situações
obscuras ou reticentes? Sou realmente independente dos objetos de minhas
escolhas ou eles me determinam?
Existe realmente
em mim essa capacidade de autodeterminação ou sou condicionado segundo as
conveniências, minhas necessidades e estruturas psicossociais? A minha vontade
é capaz de querer algo que seja um bem ainda que possa causar aparentes danos e
exigir sacrifícios ?
O individuo é
realmente lúcido para optar pelo bem ou as circunstâncias podem obscurecer
a sua decisão?
Por que
experimento um misto de ânsia, agonia, dor e angústia quando não tenho certeza
sobre o caminho a seguir? Por que a dúvida diante do bem particular, ele não
deveria impor certeza na minha escolha?
E quando conhecendo que uma coisa não é boa e mesmo assim eu a quero,
essa minha decisão é livre? Algo que universalmente parece pervertido ou
objetivamente não traz benefícios e eu retenho que seja algo positivo ou
satisfatório para mim, não seria esse um bem mesmo que em âmbito subjetivo? O
que me coloca em angústia é a incerteza do bem de minhas ações ou a
possibilidade de que as outras vias possam ser melhores que aquela que
empreendo?
E quando o
sofrimento não buscado ou provocado se abate sobre mim ou sobre os que me
rodeiam, isso é apenas uma experiência de valoração moral, porque eu tenho
consciência do bem e da perfeição que somos destinados ou essa negação da
perfeição nos faria padecer independente de minha reflexão moral?
E essa minha
capacidade de decidir ainda por coisas não boas e essa minha autodeterminação
de querer ou não querer, de decidir e não decidir, de agir ou não agir, como se
concilia com a presciência divina? Ou seja, como meus atos livres podem ser
realmente livres se a presciência divina conhece os atos futuros? Ou Deus não
intervém nas escolhas livres? E não
predestina minhas decisões livres, como Ele pode ser a causa de tudo?
A liberdade é uma
ferida que assinala a consciência de todos os seres humanos e a angústia
acontece justamente quando não nos percebemos desvinculados o suficiente para
nos autodeterminar para querer o bem e
fazer somente o que seja bom fazer; decidir é fruto de uma vontade livre e
autodeterminante, que pode ou não pode acontecer, sendo assim a presciência
divina pode conhecer os meus atos futuros, mas não minhas decisões futuras,
dado que essas podem mudarem ou não
acontecerem, isto significa que como possibilidade eu sou livre de escolher uma
estrada ou outra, a partir da escolha os atos consequentes serão já conhecidos
por Deus, pois Deus a presciência conhece os atos e não as livres decisões.
De todos os modos,
a liberdade não se apresenta absoluta nem para nós humanos e nem mesmo para
Deus, quer dizer, em Deus liberdade e necessidade se coincidem e tudo é
presente, logo as decisões futuras entram exclusivamente no uso que a pessoa
faz do seu livre arbítrio e não na presciência divina e essa é não pode
interferir ou determinar nas minhas futuras escolhas livres ou então já seria
tudo feito e não se teria mais nada a realizar, o que seria o mesmo que dizer
que tudo é predestinado a ser como deve ser sem nenhuma possibilidade de
transformação ou mudança.
A liberdade humana
se encontra na consciência que cada um tem de decidir ou não, de cometer atos
livres e cada um pode se perceber responsável por certas escolhas, sem nenhum
tipo de constrição, mas essa capacidade de autodeterminar-se é situada na
vontade livre e não no ato em si mesmo e nem mesmo a liberdade divina é
absoluta por que essa não pode determinar como agir a liberdade de quem toma
decisões livres.
Como em todas as
questões, o ponto de partida é a ação do humano, a qual se elucida em
movimento, contingente, necessitada de um infinito para justificar a sua
própria existência, já que percorrer o caminho até o infinito não seria muito
lógico.
Resta que o meu
sofrimento e a minha angústia adquirem um sentido ou um desespero justamente
por que sou livre e independente dos objetos e essa distância entre o meu ser
que deseja e a sua impotência em realizar situa a minha vontade que pode se
autodeterminar ou não perante a situação concreta e decidir como lidar com os
fatos, o que significa que a minha finitude pede um Infinito que possa iluminar
os porquês de sua mesma contingência e abertura verso outras possibilidade.
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