Desespero anunciado

Desespero anunciado




Para que essa agonia exorbitante? Parece que tudo vai se esvair
O que se deve fazer? Viver recluso na própria prisão?
Qual o sentido do que se faz e do que se pensa? Para dar satisfação?
Por que esse vazio em derredor? Esse medo é real?
Qual o valor de todos os sacrifícios e renúncias? Viver é se esconder…
O que explica essa sensação de inutilidade? Todos encurralados
O que é que leva a se ter uma náusea constante? A sensação de desespero
Por que nada satisfaz completamente? Ninguém é feito para se recrudescer
Onde se conquista essa serenidade e essa paz que anseio? Suprir o medo
De onde vem esse dissabor perante a vida? A falta de perspectivas
Por que tudo incomoda a e causa nostalgia? Não se sabe onde está a saída
Por que o silencio causa mais rumor que o nada? Os conchavos são tantos
E esse desejo de algo que não se compreende o que bem seja? Incertezas apenas
De onde vem tantos desafetos e tantas incertezas? Da mania de controle
O tempo, o futuro, o espaço e a esperanço que sentidos têm? Estão simplesmente …
Esse inverno chuvoso de saudades e de necessidades vai durar sempre? Interpelações
O verão iluminado e as cores que dão beleza duram somente um pouco…, reticências
Chegou o tempo de dar o tempo a tudo isso que é pura inutilidade
Nada mais importa, resta-me somente:
Existência fragmentada
Vida desapontada
Vocação despedaçada
Viagem destroçada
Estrada sem saída.
Coração desiludido
Futuro incerto
Desejos insanos
Andar sem destino!
Sonhos, construções, status, conquistas e reconhecimentos, tanto faz!
Tudo isso é o que? O que significa? Qual o seu valor? Saboreia-se
Diante da inenarrável passagem de tudo e de todos, o que permanece? Devaneios
A triste constatação da inutilidade. Jogados no meio do nada
Tenho que viver assim, certo da minha inutilidade e que tudo não passa de mera vaidade!
Laços, vínculos, articulações, histórias e aventuras… pensamentos tolos!
São elementos inconstantes e inconsistentes de fugidios átomos existenciais.
Dinamismo de uma realidade aterrorizada, mas ainda se tem sentido?
Esboço de sistema jamais concretizado, basta o que resta
Fundamento de uma investigação descabida, mera distração
Compêndio  de uma inutilidade concebida. Desespero anunciado!


P. Jorge Ribeiro





Desacomode

Desacomode




A busca pelo sossego leva à acomodação
A mania de estabilidade à escravidão
Sair da zona de conforto é deixar a estação
Caminhar verso o outro como direção!

O riso e o risível são nuanças da mesma face
A vida nervosa provoca e produz disfarce
De olho na rua  sem perder os enlaces
Raça e progresso como nodos do mesmo embarque!

Dar passos além dos já dados é desafiador
Desacomodação, desinstalação é inovador
Ruptura e separação sempre acarreta dor
Peregrinos nas estradas desse mundo sem valor!

A obscuridade do destino é crise e loucura
Atitude de movimento sem prégio de estrutura
Ignorar as amarras de uma felicidade futura
Desacomode e tome o cuidado como sua estatura!


P. Jorge Ribeiro




QUARESMA: conversão e missão

QUARESMA: conversão e missão



Por Pe. Jorge Ribeiro




Com o apelo incisivo e magistral do profeta Joel, “rasgai o coração, e não as vestes; e voltai para o Senhor, vosso Deus” (Jl 2, 13), dá-se inicio a liturgia do tempo quaresmal, um apelo à conversão profunda e sincera, pois esse é o tempo oportuno, o tempo da graça, o tempo favorável para a mudança, mas esse tempo se chama hoje, por isso o Apóstolo Paulo brada em gritos lacrimejantes: “Em nome de Jesus Cristo nós vos suplicamos, deixai-vos reconciliar com Deus” (2Cor 5, 20), isto é, que é agora o momento da salvação. A justificativa é que Deus não quer a morte do pecador, mas que se converta e viva. Deus é o Deus da vida, o Deus se sente glorificado pela pessoa viva, capaz de escolher o bem e de assumir a sua responsabilidade pessoal e social.
A Quaresma é esse tempo preparatório em que os cristãos buscam confrontar os seus caminhos com o caminho do Mestre, ajustar sua rota com as indicações do Senhor. O Deus de Jesus Cristo e Nosso, não é um Deus vingativo e não se alegra com a perda de nenhum de seus filhos, mas é o Deus misericordioso e compassivo, o Deus que acolhe o gemido e o perdido de perdão dos filhos arrependidos. As ações espirituais, pastorais e sociais que os cristão devem realizar na Quaresma, são gestos de desejo profundo de convergir a própria vida pessoal e social segundo os planos do Senhor, Ele que é capaz de nos dar sempre um coração novo, capaz de amar, de cantar a alegria de encontrar a salvação (SALMO 50) e de sentir uma sincera e profunda compaixão, especialmente pelos mais feridos e necessitados da comunidade (cfr. Lc 10, 33-34).
A Quaresma também é oportunidade para que os crentes refaçam sua ação na vivência da própria fé, isto é, que elimine todo ranço de vaidade, publicização e exuberância dos atos de fraternidade e solidariedade, pois a relação de compaixão, traduzida no gesto evangélico da caridade e do serviço ao próximo, deve ser realizada a partir da interiorização do amor misericordioso de Deus e, portanto, deve ser praticado como tradução duma fé encarnada e como sinal de profunda conversão, assim, deve ser vivida no silêncio e no oculto, “teu Pai que vê o que está oculto (secreto) te dará a recompensa” (Mt 6, 16) e, portanto, a caridade, assim como a oração e o jejum, não devem ser feitos para ser vistos ou reconhecidos, senão não tem valor perante a presença de Deus, mas na vivência silenciosa do encontro de cada pessoa como o próximo, como fez o “bom samaritano” (Lc 10).
A Quaresma é como se fosse a concretização do projeto dos cristãos de fazerem o caminho de volta à casa do Pai, e por isso mesmo, devem purificar o coração e a mente, para que sua experiência religiosa possa ajudar a crescer e melhorar como filhos e filhas de Deus e membros da comunidade, numa perspectiva de que as ações sejam traduções duma experiência de comunhão com o Deus Vivo, que continuamente se apresenta perante nós, na face do próximo, que por tantas vezes caído à margem das periferias da vida, clama por justiça, ajuda e compaixão. Esse é o tempo favorável, não percamos a oportunidade de nos purificarmos nas aguas profundas da oração sincera com o Pai, da renúncia de tudo que nos impede de sermos livres e serenos e, sobretudo, de nos reerguermos nas força da caridade, como fruto da compaixão e duma busca autêntica de conversão.  Somente os convertidos, isto é, os que tem um coração capaz de acolher com compaixão e cuidar do próximo, podem realizar a missão, como continuação de Jesus, que passou fazendo o bem.





Carentes

Carentes



Por Pe. Jorge Ribeiro


Todo sentimos ausência, vazio, saudades e carências. Entretanto, para quem está em certo equilíbrio, não sai à procura desregrada de se encher com as primeiras possibilidades e presenças que se encontram. A carência é como animal faminto, não escolhe o alimento. A pessoa carente busca se preencher e, caso não tenha um fundamento sólido, termina por se abarrotar de quinquilharias.
A nossa natureza humana tende a ser realizada, satisfeita, completa, feliz, mas de maneira absoluta é impossível, a não ser quando se cala ou se ignora os desejos mais profundos da alma humana; entretanto, as exigências são diversificadas e ao longo do processo existencial, as pessoas vão se acomodando e vão restringindo o desejo d felicidade a alegrias momentâneas, que provem de coisas, pessoas ou situações. Destarte essa consideração, quando algo ou alguém que oferece esse suporte já não é mais presente, geralmente, as pessoas vão em busca de uma solução, pois a ausência vazia é insuportável.
Aqui entram os subterfúgios  e as fugas, onde se mascaram os verdadeiros desejos e exigências com paliativos, que se esvaem fugazmente, mas que muitos preferem a não permanecer na carência. E tanta vezes se justifica tal sujeição a slogans de fácil manipulação sociocultural, como “meu corpo minhas regras”, “cada qual faz o que gosta”, “sou dono do meu próprio nariz”, entre tantos exemplos, e isso por um lado obscurece a mente  e o olhar da pessoa carente, que até se torna ríspida em relação aos outros e também a faz “absoluta”, justificando-se que agora é que está vivendo de verdade. O enfileirar-se de oportunidades logo bate à porta e esse caminho pode não ter volta.

A carência não é somente afetiva, mas é também social, de reconhecimento, relacional ou de outra dimensão. Em comum  a carência expressa ausência, vazio e necessidade de se completar. E quando não se tem bem claro o que se deseja e o que se pretende, a pessoa pode se empanturrar com as primeiras coisas ou pessoas que aparecem ou realidades mais fáceis também.  Algumas vezes essa carência se explode como grito de libertação ou de autonomia, mas acaba por revelar um abismo ainda maior. Enquanto seres carentes perambulamos nas vielas da existência em busca de uma sentido apaziguador e quando não se percebe claramente esse percurso ou se cansa de esperar e de caminhar, abate-se o desânimo, a tristeza e até mesmo a angústia, o que pode contribuir para que as escolhas não sejam bem elucidadas e coerentes. A carência é porta para muitos vícios, desvios, ostracionismos e outros tantos errados indumentos. O que pode curar a carência e os carentes é a presença, seja dando um significado ao existir, seja fazendo resinificar as próprias escolhas. Não se pode confundir  ausência com necessidade e nem carência com preenchimento. O que está em jogo é o valor de si mesmo e a perspectiva que tem do próprio futuro. O maior inimigo de uma vida equilibrada e que encontre a via apropriada é a ansiedade, assim como a pressa e a mania de dar satisfação.  A realização não está no complemento, mas na capacidade de si encontrar consigo mesmo.
Contra a globalização da indiferença




Por Pe. Jorge Ribeiro


A partir da assertiva que o Evangelho segundo Lucas evidencia como dinâmica da prática existencial da Palavra de Deus, que é um convite a perceber no outro, não um estranho ou adversário, mas um irmão. A Campanha da Fraternidade desse ano 2020 traz como tema geral algo que a princípio parece descontado, mas que não é bem assim, ou seja, que a Vida é Dom e Compromisso. Essa chamada de atenção enquadra o lema proposto, a saber: “Viu, sentiu compaixão e cuidou dele” (Lc 10, 33-34). É a página significativa que coloca o Bom Samaritano como encarnação do bem a ser praticado e que serve de munição e modelo para todos os crentes.
Essa campanha quer ser um antídoto contra a doença globalizada da indiferença e da falta de cuidado e responsabilidade em relação ao próximo. O convite é que a globalização da compaixão e do cuidado supra a tão famigerada globalização da indiferença. Por isso, os que acreditam no bem, precisam descortinar os olhos e abrir os braços contra essa doença que se alastra. Assim, as famílias, a igreja, as comunidades, as pastorais, os grupos e movimentos precisam se transformarem em verdadeiros hospitais, ou seja, lugar do acolhimento, da compreensão e da cura.
Quem experimenta um amor restaurador não pode ser egoísta e se esquecer dos outros, mas devem sair da própria comodidade e fazer da própria vida um bálsamo para o irmão que sofre. Por isso, o olhar de quem ama é um olhar de compaixão, como o de Jesus, que não maltrata, não condena, não exclui e nem muito menos é indiferente. O olhar do cristão e de consequência, de todos que acreditam no bem, deve ser um olhar de acolhimento, de preocupação e responsabilidade perante o próximo.
Contra a globalização da indiferença, que passa adiante e não reconhece no outro um irmão, faz necessário uma conversão e uma purificação para que essa catastrófica realidade seja transformada, quer dizer, precisa-se de um olhar e de atitudes de solidariedade social.  Essa compaixão significa, sobretudo, um compromisso com a vida, a sua proteção e cuidado, assim como a exigência de uma renovação das famílias. Essa nova economia será possível quando vivermos a nossa relação com o outro como uma relação de igualdade, fraternidade e solidariedade, isto é, quando tributarmos uma atenção benéfica aos outros, por meio de um serviço de comunhão e de acompanhamento.

As pessoas andam errantes e na tentativa de acertar fazem escolhas que acabam por escraviza-las. Não creio que ninguém queira ser vítima de injustiças, desprezos e maltratos. Deram passos, talvez sem pensa-los bem, mas que os fizeram cair em situações inumanas e até deploráveis. Entretanto, essas pessoas não precisam pagar eternamente pelos erros que cometeram ou pela falta de oportunidades que sempre se debateram, assim que entra a solidariedade como remédio contra um mentalidade que rotula a desgraça como “normal”. Quem encontrou o caminho, tem obrigação moral, de ajudar outras pessoas a encontrarem também, ofertando um sentido às suas vidas que parte do sentir-se acolhido, amado, cuidado por cada um de nós , para posteriormente se achegar a fonte de toda compaixão e sentido, Jesus Cristo, Deus em meio à humanidade.  Que nossos corações e nossas mentes abertos nos levem a abrir nossos abraços para cuidamos de tudo que Deus coloca diante de nós!

Pra se pensar ....

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